segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

Gerir/exponenciar uma crise


Uma crise interna é tanto mais grave quanto pior for a comunicação para o exterior. Foi isso mesmo que sucedeu com o Sporting desde que Bruno de Carvalho fez o explosivo comentário via Facebook na sequência da derrota em Guimarães. A opinião é sagrada mas, consoante o cargo, existem formas mais ou menos corretas de as expor. Evitando aqui – mas não menosprezando a sua importância – clarificar quem tem a maior fatia das culpas na crise ou debruçar-me sobre questões relacionadas com feitio, ingerências ou “agendas”, é possível concluir ainda assim que a crise não foi empolada, foi sim alimentada pelos seus intervenientes, uns mais do que os outros, por intervenções extemporâneas e por vezes contraditórias. Bruno de Carvalho, Marco Silva e, posteriormente, José Eduardo, foram os intervenientes de uma novela que teve o seu fim mas certamente com chama acesa nos bastidores. Foram ditas coisas que impossibilitam que, de um momento para o outro, apenas porque se disse que tudo está resolvido, estejam efetivamente as divergências sanadas.
Não há nenhum clube onde não existam problemas. A forma como os mesmos são resolvidos e, durante esse processo, é feita a comunicação é que difere e, em vários casos, acaba por fazer a diferença. Diz-se que Bruno de Carvalho tem um perfil muito próprio, que acaba facilmente por entrar em choque; diz-se que Marco Silva tinha uma agenda própria, que passaria por destituir o presidente. Verdade ou não, o clube não atacou o chorrilho de acusações a tempo e deixou que as mesmas espalhassem a confusão.
O primeiro episódio pós-Guimarães, que aqueceu o ambiente até ao ponto de ebulição, ocorreu na célebre comunicação apenas dois dias antes do importante jogo na Madeira, com o Nacional. Bruno de Carvalho exigiu publicamente que todos dessem a cara e assumissem os seus erros, enviando recados para treinador e jogadores quando o deveria ter feito “cara a cara”, fora do escrutínio público – “modus operandi” que Marco Silva admitiu preferir quando tem de criticar, após esse encontro com os insulares.
À célebre reunião que ditou a rotura naquele momento seguiu-se um blackout que tinha por objetivo impedir uma certa lavagem de roupa suja no espaço público. Mas o mal já estava feito, fosse pela ausência de esclarecimentos plausíveis às notícias sobre a quebra na relação entre Bruno de Carvalho e Marco Silva, fosse – e aqui, refira-se, o controlo das declarações era bem mais complicado – pelas intervenções de antigos dirigentes e sócios. É aqui que entra José Eduardo. O ataque pessoal do também antigo jogador manteve a quezília na ordem do dia. Pior, ao dizer que estava mandatado pela direção (Bruno de Carvalho, portanto) – ou autorizado, segundo esclarecimentos recentes –, José Eduardo deixou no ar que ilustrava a posição do presidente no diferendo. É impensável, se estamos a falar de um relacionamento no mínimo cordial entre presidente e treinador, que o mais alto representante de um qualquer emblema não repudie um ataque daquele calibre ao seu técnico. Ao não desmenti-lo na altura, não legitimou as críticas de José Eduardo mas alimentou a ideia de que tinha efetivamente “autorizado” – questões de semântica… – José Eduardo e que o complô para destituí-lo era verdadeiro. As únicas declarações de BdC sobre o assunto, aliás, foram para elogiar as intervenções de José Eduardo e Eduardo Barroso. Elucidativo?

O bom-senso surgiu finalmente no sábado, num comunicado onde Bruno de Carvalho apelou à união, garantiu a continuidade de Marco Silva e “desautorizou” José Eduardo, deixando-o por conta própria, ao sublinhar que “apenas estão mandatados para exprimir as suas opiniões os membros dos órgão sociais do clube”. Sobressaem, assim, algumas notas: Bruno de Carvalho apercebeu-se do exagero das suas intervenções… e intenções; Marco Silva mostrou enorme carácter, ora visando a união, ora respondendo de forma assertiva e com classe quando o momento se impunha, tendo sido claramente o elemento que melhor geriu o aspeto comunicacional na crise; José Eduardo acabou por cair sozinho, não só por ter sido isolado por BdC mas também pela incapacidade em explicar como é possível dizer que um treinador tem uma agenda que visa destituir o presidente do clube e depois afirmar que lutou por um entendimento e que defende até a sua continuidade…
Por João Socorro Viegas




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