O futebol é um desporto, sim, mas é cada vez mais uma batalha complexa, que envolve muitos interesses e muito dinheiro.
Ganhar não é, apenas, uma questão de prestígio: há muitos empregos que dependem do sucesso desportivo de um clube ou de uma seleção, há contratos de patrocínio que se celebram ou perdem.
Jorge Valdano, campeão do Mundo pela Argentina em 1986 e antigo diretor-geral do Real Madrid, numa das várias definições geniais que fez sobre o belo jogo, decretou: «O futebol não é uma questão de vida ou morte. É muito mais do que isso».
Descontado o lado figurativo da expressão, talvez não seja um exagero o que postulou o «príncipe das ideias claras».
Para lá do que é, será sempre, o mais relevante (a qualidade dos executantes dentro do campo), será que a comunicação também pode ajudar a marcar golos?
Surpreendentemente, a resposta pode ser... sim.
Foquemo-nos nos discursos dos treinadores e vejamos alguns exemplos.
Um dos mais claros é José Mourinho. Autoproclamado «Special One» na primeira passagem pelo Chelsea, tem tido, quase uma década depois, muito mais dificuldade, nesta segunda aventura em Stamford Bridge, em por os «Blues» no caminho das vitórias.
Depois de cada derrota (já foram algumas, mais do que as previstas), Mourinho usa sempre a arma da palavra para minimizar os efeitos da derrota em campo.
Após o desaire com o Stoke City para a Premier League, na conferência de Imprensa de véspera do jogo com o Steaua Bucareste para a Champions, o técnico português fez uma rábula com o tradutor (elogiou-o, ofereceu-lhe a camisola).
Num golpe de mágica, Mourinho transformou uma conferência de Imprensa que tinha tudo para ser dominada pelo mau momento desportivo de forma do Chelsea numa sessão com sorrisos e piadas em torno do tradutor para romeno.
No dia seguinte, o Chelsea regressava às vitórias. Por várias vezes, Mourinho usou esta técnica nos últimos anos. E quase sempre, com eficácia.
No início da época, César Azpilicueta, lateral espanhol, sentia-se mal amado no Chelsea. Mourinho, na véspera de um importante jogo no reduto do Arsenal para a Taça da Liga inglesa, decidiu dar-lhe moral e garantiu: «Gosto muito de César. Espero que o respeitem e gostem dele tanto como eu. Os jogadores ganham jogos, os plantéis ganham títulos. Sou um treinador sortudo por ter o César».
No dia seguinte, Azpilicueta marcou e o Chelsea ganhou ao Arsenal.
Por cá, também há treinadores a assumir usar o discurso para «marcar golos».
José Couceiro pegou num V. Setúbal em crise e conseguiu colocá-lo a meio da tabela. Graças às palavras? «É claro que, hoje em dia, a comunicação conta muito. Toda a gente sabe isso. Mas quem joga são os jogadores. São eles que decidem as partidas», recordou o técnico, no «Future Football Congress», recentemente realizado na Maia.
Rui Vitória, treinador do V. Guimarães, é outro exemplo de quem tem sabido usar a força da palavra para fazer face às dificuldades.
Num Vitória com poucos recursos, ganhou a Taça de Portugal na época passada e pratica um futebol elogiado por todos. Para o técnico vimaranense, a chave está em mostrar, como treinador, «serenidade, mesmo quando se passa por turbulência».
Já Pedro Emanuel revela ter a preocupação de lançar sempre uma «headline», uma ideia forte em cada conferência: «Como estou em Arouca, e Arouca parece que fica longe de tudo, é raro aparecerem muitos jornalistas, é a forma que encontro para ver se a mensagem passa».
Nuno Espírito Santo é, no Rio Ave, um treinador com cautelas assumidas. É raro vê-lo expansivo. Mede muito bem tudo o que diz. E isso é estudado: «Vejo a comunicação como uma estratégia. Um instrumento que nos poderá ajudar a vencer e que pode levar-nos a criar problemas ao adversário. É instrumental».
Os que os treinadores dizem não garante que a bola entre na baliza da equipa adversária. Mas é uma boa ajuda para que se atinjam os objetivos propostos.
No futebol de alta competição, não há quem prescinda do trunfo da comunicação.
Germano Almeida
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