Fomos educados que a nossa vida é possível, porque existimos.
É possível porque nascemos, estudamos, temos uma família e amigos e
vivemos num mundo real e civilizado, ganhamos e gastamos dinheiro em coisas
reais, para viver ou para sobreviver. Tudo isto é possível porque vemos e
sentimos. Mas será que o “possível” nos chega?
Muitos de nós diríamos que sim: temos tudo o que queremos.
Estamos confortáveis nos sofás que compramos no IKEA, com a TV que levamos da
MediaMarkt ou com os pijamas fofinhos que a Zara tinha em promoção.
Aceitamos sem
questionar o que temos, o que nos dão, o que herdamos, o que conquistamos ao
longo dos muitos anos desde a velha escola primária, naquela altura em que a
madrinha nos deu aquele ursinho carinhoso que nunca mais perdemos de vista.
Aquele ursinho, lá no nosso quarto, dá-nos a segurança de que tudo está bem,
mesmo com todas as crises e guerras deste mundo, o ursinho sobrevive a todas
sempre com os mesmos olhos de ursinho feliz com o País que tem, com a segurança
de que nada lhe poderá acontecer: tudo está no sítio em que deveria estar,
somos felizes.
Dão-nos, nós recebemos e guardamos. Check.
Mas a verdade é que todos temos medo que isto mude, o receio
de que alguma variável da nossa vida confortável se altere para algo que não
queremos, que não desejamos e que não estava nos planos.
No entanto, a vida não
está nunca nos planos, nós não acordamos de manhã, abrimos e agenda e
escrevemos: hoje, às 10h45, vou viver. Temos essa garantia de que as 10h45 de
hoje vão ser iguais às de ontem, por isso não escrevemos nem sequer pensamos
nisso.
Vemos os nossos familiares a perder o emprego, os nossos filhos a
regressar a casa porque não conseguem pagar a renda das suas casas, vemos no
telejornal como a fome em África ainda existe, apercebemo-nos de que uma
possível 3.ª Grande Guerra Mundial poderá estar a rebentar entre a Rússia e a
Ucrânia e, vezes sem conta, vemos e mostramos aos nossos amigos os vídeos do
Facebook que mostram como o Estado Islâmico decapita e comete atentados contra
cidadãos e cidades. Outros cidadãos. Outras cidades. Mas não contra nós. E,
apesar de vermos tudo isto muito superficialmente, dá-nos um medo terrível de
morrer, de perder, de deixar de existir, dá-nos medo de “deixar de ser possível”.
Por isso, damos um passo atrás e fingimos que não sabemos
que isto acontece: fingimos não saber que existem pessoas que morrem por
injustiças, por guerras, por fome. Queremos viver os nossos 80 anos até ao fim,
e mesmo que sejam apenas 50 anos, queremos vivê-los bem. Porque temos medo da
dor, da perda, do sangue. Temos medo de perder o ursinho que nos deram para
sempre.
Mas isto é uma escolha de alguns: recuar é uma escolha.
Há outros que escolhem lutar contra as injustiças, que
ensinam os seus filhos a ser mais e melhor.
Existem pessoas que saem do seu
País e vão para o Quénia construir e ajudar nas escolas, como a Diana
Vasconcelos, outras vão para a Amazónia ajudar na luta ambiental.

Acima de tudo,
existem aqueles que são presidentes, comissários ou representantes de países
importantes, que vêm as decapitações que acontecem lá longe e que não toleram
estas violações dos Direitos Humanos.
Porque é impossível aceitar o mundo como
ele se está a tornar, eles tomam medidas contra os poderosos nas suas casas de
mármore e ajudam os que estão lá a sofrer, sem oportunidades de viver.
São
estas pessoas que fazem a diferença, as que escolhem tornar o nosso mundo
melhor, porque fechar os olhos é fácil e confortável, mas isso não faz nada, a
falta de acção é isso mesmo: nada, zero, vazio, é desculpar uma ameaça.
Mas,
optar por ajudar, é não deixar de existir. Optar por mudar é mostrar que
existimos, somos reais, e fazemos a diferença.
É possível fazermos a mudança,
sim custa-nos imenso, vai ser necessário criarmos recursos que ainda não temos,
teremos que arregaçar as mangas e iniciar algo que ainda não fizemos antes.
Mas
é possível mudar o mundo.
Nós sabemos que é possível existir pois somos a prova disso.
Estamos num País seguro, acordamos e adormecemos. Mas, no final do dia, noutros
locais remotos do mundo, eles acordam e pensam: hoje, às 10h45, ainda estou
vivo.
Diana Carvalho
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